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Hitler tinha antepassado judeu? Entenda a origem de comentário do chanceler russo que indignou Israel

Sergei Lavrov fez afirmação em entrevista à televisão italiana. Tel Aviv exigiu pedido de desculpas e convocou embaixador russo. Berlim chamou comentário de ‘absurdo’. O ministro das Relações Exteriores, Sergei Lavrov, sugeriu que Hitler tinha sangue judaico, ao comparar o ditador com o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky
Reuters via BBC
O ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, afirmou em uma entrevista a um canal de televisão italiano que o ditador alemão Adolf Hitler tinha origens judaicas. A declaração causou revolta no governo de Israel, que convocou o embaixador russo no país para pedir esclarecimentos.
O governo de Israel afirmou que formalizou ao Kremlin um pedido para que Lavrov se desculpe. A afirmação foi feita pelo russo no domingo (1º) durante uma entrevista ao canal Rete 4, da Itália.
O que Lavrov disse exatamente?
Na entrevista, Lavrov foi perguntado como a Rússia poderia dizer que precisava “desnazificar” a Ucrânia – um dos argumentos de Moscou para invadir o país vizinho – se o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, é judeu.
“Acho que Hitler também tinha origens judaicas, portanto isso não significa nada”, respondeu o chanceler russo à entrevistadora.
Qual foi a reação de Israel?
O primeiro-ministro israelense, Naftali Bennet, pediu nesta segunda-feira (2) que o Holocausto deixe de ser usado “para fins políticos”. O ministro das Relações Exteriores de Israel, Yair Lapid, disse que a fala é ofensiva e mentirosa.
“Os comentários do ministro Lavrov são escandalosos, imperdoáveis e um horrível erro histórico”, afirmou Lapid, que convocou o embaixador da Rússia em Israel.
O presidente do Yad Vachem, memorial israelense do Holocausto, Dani Dayan, também criticou as declarações de Lavrov como “comentários infundados, delirantes e perigosos que merecem ser condenados”.
Desde o início da invasão russa da Ucrânia em 24 de fevereiro, Israel tenta manter um delicado equilíbrio entre Kiev e Moscou, mas as palavras de Lavrov provocaram indignação.
Em um discurso no fim de março para os integrantes do Parlamento de Israel, Zelensky pediu ao país que tomasse uma decisão de apoio à Ucrânia contra a Rússia e solicitou o envio de armas.
Presidente do Memorial do Holocausto nega falas de Lavrov sobre Hitler ter raízes judaicas
E a Alemanha, disse o quê?
A Alemanha também criticou a declaração de Lavrov. O porta-voz do governo alemão, Steffen Hebestreit, disse nesta segunda-feira (2) que o russo disse é uma “propaganda absurda”.
O ministro das Relações Exteriores da Ucrânia, Dmytro Kuleba, por sua vez, afirmou que “Lavrov não consegue esconder o antissemitismo profundamente enraizado nas elites russas”.
“Estas declarações são ofensivas para o presidente Zelensky, para a Ucrânia, Israel e para o povo judeu”, declarou Kuleba em sua conta no Twitter.
Israel forneceu equipamentos de proteção à Ucrânia, mas não enviou armas recentemente ao país, segundo funcionários do governo.
O conselheiro da presidência ucraniana Mikhailo Podoliak denunciou as declarações como “antissemitas” e afirmou que “são a prova de que a Rússia é sucessora da ideologia nazista”.
Existe alguma base para afirmar que Hitler tem ascendência judaica?
Há décadas há alegações não comprovadas de que o avô paterno de Hitler era judeu. Essa idea foi alimentada por uma afirmação feita por um advogado de Hitler, Hans Frank.
Em suas memórias, publicadas em 1953, Hans Frank conta que Hitler lhe pediu para investigar suas origens em 1930, depois que seu sobrinho, William Patrick Hitler, ameaçou expor que o avô do líder seria judeu.
Frank afirmou que descobriu evidências de que o avô de Hitler era de fato judeu. A alegação vem desde então reverberando como teoria da conspiração. Ela não teve uma comprovação definitiva.

Que evidências encontrou o advogado?
Hitler mandou investigar se tinha um avô judeu
AFP
Três anos atrás, o psicólogo Leonard Sax publicou num periódico chamado “Journal of European Studies” uma nova análise das alegações de Frank divulgadas em 1953.
O livro de memórias do advogado foi na verdade escrito em 1946 (logo após o fim da 2.ª Guerra Mundial), mas publicado somente sete anos depois, após Frank ser executado como criminoso de guerra durante os julgamentos de Nurembergue.
“Frank afirmou ter descoberto evidências em 1930 de que o avô paterno de Hitler era um judeu que morava em Graz, na Áustria, na casa onde a avó de Hitler era empregado”. Foi em 1836 que a avó de Hitler, Maria Anna Schicklgruber, engravidou, explica Sax, segundo reportagem publicada no jornal israelense “Jerusalem Post”.
“Frank escreveu em suas memórias que conduziu uma investigação como Hitler havia solicitado e descobriu a existência de correspondência entre Maria Anna Schicklgruber – a avó de Hitler – e um judeu de sobrenome Frankenberger que morava em Graz. De acordo com Frank, as cartas sugeriam que o filho de 19 anos de Frankenberger havia engravidado Maria Anna enquanto ela trabalhava na casa de Frankenberger. (…) O filho ilegítimo de Schicklgruber havia sido concebido sob condições que exigiam que Frankenberger pagasse pensão alimentícia”, detalha o pesquisador.
Sax escreve no estudo que, de acordo com as cartas nas memórias de Frank, “Frankenberger pai enviou dinheiro para o sustento da criança desde a infância até seu aniversário de 14 anos”.
“A motivação para o pagamento, de acordo com Frank, não era caridade, mas principalmente uma preocupação com o envolvimento das autoridades: ‘O homem judeu pagou sem ordem judicial, porque estava preocupado com o resultado de uma audiência no tribunal e a publicidade relacionada'”, segundo as cartas.
Sax observa que essas alegações de Frank e suas memórias foram, desde então, questionadas pelo meio acadêmico, que desconsiderou amplamente as alegações de Frank sobre um possível avô judeu de Adolf Hitler.
Nos anos 50, o autor alemão Nikolaus von Preradovich disse ter provado que “não havia judeus em Graz antes de 1856”, o que derrubaria o relato de Frank.
Sax apresenta no estudo de 2019 evidências em contrário: nos arquivos austríacos ele constatou que havia sim uma comunidade judaica na cidade austríaca antes de 1850 e destacou que Preradovich era um simpatizante do nazismo, “que se ofendeu com a sugestão de que Adolf Hitler seria um quarto judeu”.
O presidente ucraniano Volodymyr Zelensky em visita a Israel, em janeiro de 2020
Divulgação/Presidência da Ucrânia
Portanto, o estudioso aponta que as bases do consenso acadêmico que desacredita a tese de Frank podem estar erradas e sugere alguns caminhos que poderiam levar ao esclarecimento da questão de uma suposta raiz judaica na família de Hitler. Por outro lado, também não aponta uma resposta definitiva.
De qualquer forma, mesmo que uma obscura ligação de parentesco entre Hitler e um judeu fosse agora comprovada, isso ainda seria completamente diferente do caso de Zelensky, que é sabidamente de família judaica.g1 > MundoRead More

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