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Jornalista russo leiloa medalha do Nobel da Paz para ajudar refugiados ucranianos

A paz não tem preço. Entretanto, a fim de buscá-la, o vencedor do prêmio Nobel da Paz em 2021, por “defender a liberdade de expressão na Rússia sob condições cada vez mais desafiadoras”, o jornalista Dmitry Muratov, 59 anos, está leiloando a medalha que ganhou pelo seu trabalho sobre direitos humanos e outros tópicos politicamente sensíveis no país. As informações são da agência Associated Press.

O dinheiro será revertido para o Unicef (Fundo de Emergência Internacional das Nações Unidas para a Infância), de modo a ajudar crianças deslocadas pela guerra na Ucrânia. Os lances online começaram em 1º de junho, coincidindo simbolicamente com o Dia Internacional da Criança. Nesta segunda-feira (20), Dia Mundial do Refugiado, Muratov participa de um evento ao vivo do leilão em Nova York.

“Queremos devolver o futuro deles”, justificou o jornalista, que à frente do jornal Novaya Gazeta, tido como o principal veículo investigativo russo há décadas, trouxe reportagens sobre a queda do vôo MH17 e abusos dos direitos humanos na república da Chechênia, incluindo expurgos gays.

Dmitry Muratov, jornalista russo vencedor do Nobel da Paz (Foto: Olaf Kosinsky/Wikimedia Commons)

Em um vídeo compartilhado pela casa de leilões Heritage Auctions, que coordena a venda sem receber parte nos lucros, o jornalista insta outras pessoas a seguirem o exemplo. As ofertas já batiam os US$ 550 mil no início do dia, mas a estimativa é de que o objeto seja arrematado por um valor muito maior.

“Tem que se tornar o começo de uma mobilização para que as pessoas leiloem seus bens valiosos para ajudar os ucranianos”, disse Muratov na gravação.

Muratov, que dividiu o Nobel com a jornalista filipina Maria Ressa, do site Rappler, também falou que as sanções ocidentais impostas contra a Rússia não impedem que ajuda humanitária, como remédios para doenças raras e transplantes de medula óssea, chegue aos necessitados.

Além de ser uma importante voz antiguerra no conflito, que levou 5 milhões de ucranianos a buscarem refúgio em outros países e gerou a maior crise humanitária no continente europeu desde a Segunda Guerra Mundial, o jornalista é um crítico feroz da anexação da península da Crimeia pela Rússia em 2014.

Jornalistas independente têm sido alvo do Kremlin. Pelo menos dez grandes emissoras ou publicações foram fechadas ou forçadas a cessar as operações, entre elas a própria Novaya Gazeta, um dos tradicionais pilares de resistência da imprensa livre, que jogou temporariamente a toalha e decidiu suspender as atividades na Rússia. Pelo menos até que as ofensivas em solo ucraniano cessem, segundo a direção. 

Por que isso importa?

Organizações não-governamentais, veículos de imprensa e os colaboradores de ambos têm sido o principal alvo da repressão do presidente Vladimir Putin, com o respaldo da Justiça do país. A perseguição se escora na “lei do agente estrangeiro”, que foi aprovada em 2012 e modificada diversas vezes, dando às autoridades o poder de acessar todas as informações privadas das instituições e indivíduos rotulados.

A designação “agente estrangeiro” carrega conotações negativas da era soviética e serve para rotular o que seriam organizações envolvidas em atividades políticas financiadas pelo exterior. Entidades listadas também são obrigadas a rotular com o selo de “agente estrangeiro” todo conteúdo que venham a divulgar, algo que afeta particularmente as organizações de mídia.

Órgãos e indivíduos que não atendam às exigências impostas pela lei podem pegar pena de até dois anos de prisão, de acordo com o código penal russo, e as organizações podem ser proibidas de funcionar. A classificação também afasta potenciais parceiros comerciais e anunciantes, muitas vezes sufocando financeiramente as instituições listadas.

Tal sistema repressivo tem sido a principal arma do Kremlin para calar os críticos, levando a ordens de prisão, casos de exílio forçado e ao fechamento de entidades.

censura na Rússia, que já era forte antes da invasão da Ucrânia por tropas russas, tem se intensificado durante a guerra. Em março, o Legislativo aprovou um projeto de lei que criminaliza a distribuição do que o governo vier a considerar “notícias falsas” sobre operações militares russas.

De acordo com o texto legal, passa a ser proibido publicar conteúdo “contra o uso de tropas russas para proteger os interesses da Rússia” ou “para desacreditar tal uso”, o que prevê uma pena de até três anos de prisão. A mesma punição se aplica àqueles que venham a pedir sanções ao país.

Em certos casos, o artigo prevê pena máxima de até dez anos de prisão, mas pode haver agravantes que venham a aumentar a sentença. Nos casos que a Justiça considere terem gerado “consequências sérias”, a punição sobe para até 15 anos.

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