Biden opta pela realpolitik no Oriente Médio
Presidente americano abraça conquistas do antecessor Trump em Israel e camufla histórico sanguinário da Arábia Saudita para evitar desastre eleitoral. Presidente americano, Joe Biden, durante entrevista coletiva em Israel
Atef Safadi/REUTERS
É interessante observar o comportamento de Joe Biden nessa primeira viagem ao Oriente Médio como presidente dos EUA. Em Israel, que visita pela décima vez, ele dá seguimento, com entusiasmo, a uma conquista de seu antecessor, Donald Trump, respaldando os Acordos de Abraão, que normalizaram as relações entre o Estado judeu e alguns países árabes.
Na Arábia Saudita, que ele prometeu isolar após o assassinato do jornalista Jamal Khashoggi, Biden opta pela realpolitik, focado em reduzir os preços do petróleo, a inflação doméstica e, com isso, evitar um desastre democrata nas eleições de novembro.
Pela primeira vez, um presidente americano usará o espaço aéreo israelense para desembarcar em Jeddah, na Arábia Saudita, abrindo caminho para normalizar os voos comerciais entre os dois países.
O principe herdeiro da Arábia Saudita, Mohammed bin Salman, busca diversificar a economia do país.
Reuters via BBC
O primeiro passo foi dado por Trump, estabelecendo relações de Israel com os Emirados Árabes Unidos e Bahrein, pelos Acordos de Abraão, assinados em 2020, que depois resultaram na aproximação com Sudão e Marrocos.
Em vez de reverter a política de Trump, como fez tantas vezes em 18 meses no cargo, Biden preferiu expandi-la e encorajar uma nova dinâmica entre países árabes e Israel para mudar a paisagem geopolítica no Oriente Médio e incrementar a segurança na região. Os palestinos, mais uma vez, foram relegados ao lugar de lanterna.
Viagem de Biden no Oriente Médio pode aproximar Israel e Arábia Saudita e isolar ainda mais palestinos
EUA e Israel se comprometem conjuntamente a negar armas nucleares ao Irã
Ainda é muito prematuro vislumbrar que o mesmo ocorra entre Israel e Arábia Saudita, mas uma coordenação secreta e embrionária vem se desenhando neste sentido. É calcada, sobretudo, na ideia de uma frente regional que consiga conter o crescente avanço do Irã na região, desencadeado após a saída dos EUA do acordo nuclear entre Irã e seis países.
Em Jeddah, onde desembarca nesta sexta-feira, começa a etapa mais espinhosa da turnê de Biden. Ficará frente a frente com o príncipe Mohammed bin Salman, que ele se propôs a isolar ao assumir o comando dos EUA.
O presidente dos EUA, Joe Biden, e o primeiro-ministro dos Estados Unidos, Yair Lapid, em encontro durante a viagem de Biden para o Oriente Médio, em 14 de julho de 2022.
Evelyn Hockstein/Reuters
A Arábia Saudita foi classificada como pária pelo então candidato democrata em sua campanha eleitoral. Como presidente, esnobou o príncipe herdeiro, acusado pela CIA de responsabilidade no esquartejamento do jornalista Khashoggi.
Os ventos mudaram de direção. A Rússia invadiu a Ucrânia, os preços do petróleo dispararam e pressionaram o presidente americano a ser pragmático e camuflar o histórico sanguinário do reino em matéria de direitos humanos. O deslocamento de Biden se dá sob uma perspectiva sombria, focada no petróleo e nos interesses estratégicos dos EUA.
Como resumiu Fred Ryan, CEO do “Washington Post”, onde Khashoggi trabalhava, a viagem corrói a autoridade moral dos EUA e envia uma mensagem perigosa sobre os valores que a nação atribui à imprensa livre. “Por que o presidente Biden vai agora a Jeddah de joelhos para apertar a mão manchada de sangue do ‘pária’? Mais uma vez, ele está buscando votos.”g1 > MundoRead More