Dissidentes cubanos reagem com indignação aos elogios do Papa a Raúl Castro
Declarações de Francisco coincidem com primeiro aniversário dos protestos pacíficos contra o regime, que mantém 800 manifestantes presos, acusados de terrorismo. Papa Francisco durante encontro com o então líder cubano, Raul Castro, em 2015.
Tony Gentile / Reuters
Pegou mal entre os dissidentes do regime cubano as declarações do Papa Francisco sobre sua relação humana com o ex-presidente Raúl Castro. O timing dos elogios do Pontífice não poderia ser mais inadequado: os opositores marcam o primeiro aniversário dos protestos em massa contra o sistema político que vigora há mais de seis décadas em Cuba.
O governo mantém presos arbitrariamente, sob a acusação de terrorismo, cerca de 800 manifestantes, muitos julgados e condenados com sentenças desproporcionais.
“Santidade: há palavras e declarações que ferem mais do que a repressão. Ouça as mães dos jovens presos do 11 de Julho e diga não aos poderosos. Devemos isso ao Evangelho”, reagiu o historiador e ativista católico Leonardo Fernández Otaño, que chegou a ser detido nos protestos pacíficos e depois foi expulso do doutorado que cursava na Universidade de Havana.
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Numa entrevista às jornalistas mexicanas María Antonieta Collins e Valentina Alazraki, das emissoras Univisión e Televisa, Francisco afirmou que a ilha é um símbolo, por sua grande história: “Eu amo muito o povo cubano, com quem tive boas relações, e também confesso que tenho uma relação humana com Raúl Castro.”
Na mesma velocidade com que o regime aproveitou para destacar na mídia oficial as declarações laudatórias do Papa, dissidentes e exilados expressaram raiva e indignação nas redes sociais:
“A Ilha é ‘um símbolo’ e tem uma ‘grande história’ de totalitarismo e repressão. Neste aniversário esperava-se um pronunciamento claro e de solidariedade de sua Santidade. ‘Uma relação humana’ com as pessoas que sofrem”, protestou a presidente da Federação Espanhola de Associações Cubanas e da Rede de Mulheres Cubanas, Elena Larrinaga.
Opositores cubanos desaprovam a forma tímida com que o Vaticano manifestou solidariedade após os protestos que varreram a ilha em julho passado e resultaram em mais de 1.300 detenções.
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Desde então, o regime incrementou fortemente a repressão contra opositores, mantidos sob vigilância cerrada e impedidos de organizar novas manifestações.
Em outubro, sob o argumento de ter recebido informações de um suposto ataque, a Santa Sé proibiu a entrada de centenas de cubanos, que queriam participar da celebração do Angelus dominical, para dar visibilidade a uma marcha no dia 15 de novembro e à situação dos presos políticos.
Terceiro Pontífice a visitar Cuba, em 2015, Francisco foi recebido por Fidel Castro, já aposentado, e saudado pelo irmão Raúl, que resumiu, na época, o clima de cordialidade entre os dois: “Se o Papa continuar assim, voltarei à Igreja Católica.” Francisco tornou-se mais um elemento divisor entre o regime e seus opositores.
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