Um ano após maiores protestos na história recente de Cuba, regime responde com repressão, e dissidência segue sem espaço
Human Rights Watch publicou um documento no qual afirma que houve violações dos direitos humanos espancamentos e casos de maus-tratos, que, em algumas situações, constituem tortura. Policiais em rua de Havana, em 11 de julho de 2022
Alexandre Meneghini/Reuters
Um ano após as manifestações que aconteceram simultaneamente em cerca de 40 cidades em Cuba, o regime mantém presas aproximadamente 700 pessoas que participaram daqueles atos de oposição presas.
Mais de 380 manifestantes foram sentenciados —entre eles há menores de idade, segundo a Human Rights Watch, uma entidade não governamental dos Estados Unidos.
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Alguns dos participantes do evento de 2021 tentaram organizar uma manifestação pela internet, mas os principais dissidentes políticos estão detidos ou exilados.
Veículo de forças especiais passa pelo centro de Havana, em Cuba
Alexandre Meneghini/Reuters
Na sexta-feira, manifestantes afirmaram que foram alertados por agentes de segurança a nem mesmo saírem de casa nesta segunda-feira (11).
O presidente cubano, Miguel Díaz-Canel, afirmou no fim da semana passada que o país comemora a derrota de “um golpe vândalo”.
“Estou convencido de que, defendendo o socialismo, vamos superar a difícil situação atual e derrotar os imperialistas”, disse ele, referindo-se à crise econômica que a ilha enfrenta, a pior em três década.
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O que aconteceu há um ano
Em 11 de julho de 2021, milhares de cubanos saíram às ruas para participar do protesto que foi considerado o maior da história recente.
Confronto entre manifestantes e policiais sem identificação em 11 de julho de 2021 em Havana, Cuba
Alexandre Meneghini/Reuters
As manifestações começaram na cidade de San Antonio de los Baños, no sudoeste de Havana. Imagens dos atos foram divulgadas na internet, e mais gente saiu para as ruas, em outras cidades.
Os protestos na ilha, aparentemente, foram resultado de um cansaço da população agravado por crises econômicas e de saúde.
No início de 2021, o governo aumentou os salários, mas isso fez os preços dispararem. O país enfrentava uma inflação crescente, apagões, falta de alimentos, remédios e produtos básicos.
Reação dura, desmedida e desproporcional
“No ano passado houve coragem para protestar, mas a reação foi dura, desmedida e desproporcional, houve prisões arbitrárias, há sinais até de tortura, de acordo com a Human Rights Watch”, diz Paulo Velasco, coordenador da graduação em Relações Internacionais da Uerj.
Agora, a atuação da dissidência é ainda mais restrita, sem possibilidade de “criar um jogo político mais representativo”, segundo ele.
“Não parece haver condições institucionais ou disposição em viabilizar um diálogo com parte da sociedade que defende mudanças”, afirma.
Só não se pode chamar a atual situação de retrocesso, de acordo com o professor, porque nunca houve avanço.
Para Velasco, a única ação que a oposição pode adotar, agora, é tentar se comunicar com órgãos internacionais, como a própria Human Rights Watch.
Maus tratos que constituem tortura
A Human Rights Watch afirmou em um documento que o governo cubano tem um plano para impedir manifestações, punir quem participar delas e “suscitar temor” com o objetivo de evitar novos atos contra o regime.
A entidade relatou 155 casos de abusos após os protestos de 2021. Houve “um grande número de violações dos direitos humanos cometidas no contexto dos protestos, que incluem intimidações, detenções arbitrárias, processos penais abusivos, espancamentos e outros casos de maus-tratos, que, em algumas situações, constituem tortura”, diz o texto.
Para a Human Rights Watch, as violações que o regime comete sugerem a existência de um plano para impedir que as pessoas protestem, punir quem fizer isso e suscitar temor para evitar novas manifestações em massa.
O texto afirma também que as autoridades cubanas adotaram medidas para desmantelar o limitado espaço cívico que permitiu que os protestos ocorressem.
A repressão do governo, assim como sua falta de interesse para abordar as causas subjacentes que levaram muitos cubanos às ruas, “aumentaram drasticamente o número de pessoas que decidiram deixar o país”, relata o documento.
Em seis tópicos
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos também publicou um texto com críticas ao regime cubano. A organização identificou seis medidas do Estado para reprimir a dissidência:
Uso da força e campanhas de intimidação;
Detenções arbitrárias, violações ao processo judicial e maus tratos;
Criminalização de manifestantes;
Fechamento de espaços democráticos
Continuidade de privação da liberdade, juízos sem garantias do processo judicial e penas elevadas;
Propostas de lei para vigiar e castigar expressões de oposição e críticas ao governo, assim como a criminalização de organizações independentes da sociedade.
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