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Romário, Edmundo, Roger, Ramon e muitas confusões: conheça os bastidores do Fluminense de 2004

Romário, Edmundo, Roger, Ramon e muitas confusões: conheça os bastidores do Fluminense de 2004

Frases históricas, troca pública de farpas entre astros, discussões por premiação… Entenda por que deu errado o estrelado elenco tricolor há 20 anos Disputa pela camisa 10, egos nas alturas, muita vaidade e trocas de farpas públicas. Há duas décadas, o Fluminense montava um dos seus elencos mais renomados neste século, com o que viria a ser conhecido como o primeiro grande time da “era Unimed” com Romário, Edmundo, Roger e Ramon.
Em 2004, entrosamento entre Edmundo e Romário começa a aparecer no Fluminense
A expectativa por títulos, porém, deu lugar a muitas confusões. Aquele time ficaria marcado pela frase “entrou no ônibus agora e quer sentar na janela” de Romário ao referir-se ao técnico Alexandre Gama e por uma briga, com entrevistas marcantes, entre Edmundo e Roger.
“Jogaria de novo com o Romário, mas com o Roger, não. A diferença entre nós é que eu nunca ganhei nada no Fluminense. Ele nunca ganhou nada na vida”
“As opiniões do Edmundo não têm importância alguma para mim. Não o tenho como referência para nada. O Edmundo não serve como exemplo de homem, pai de família ou profissional”
Edmundo deu fortes declarações após saída de Roger
Reprodução Jornal O Globo
Até as declarações acima, dadas em dezembro de 2004, algo inimaginável hoje em dia, com entrevistas escassas, coletivas cheias de regras e assessores de imprensa escalados para evitar problemas, o fracasso daquele Tricolor foi sendo construído passo a passo. Foi um ano de saídas precoces, troca de treinadores e frustração pela falta de títulos.
Roger rebateu as declarações de Edmundo
Reprodução Jornal O Globo
Nos 20 anos daquele time, o ge conversou com personagens e resgatou entrevistas. Boa parte dos jogadores, técnicos e pessoas ligadas ao clube foram procurados. Os que aceitaram participar contaram histórias e bastidores da fatídica temporada tricolor.
A construção
O ano de 2004 teve o início mais animador do Fluminense em quase duas décadas. Após amargar o pior capítulo da sua história, com a disputa da Série C em 1999, o clube renascia. O elenco era formado por jovens que alcançariam destaque anos depois, como Diego Souza, Maicon e Léo Moura. E já tinha uma estrela: Romário, que estava nas Laranjeiras havia um ano e meio, com uma breve saída apenas para atuar no Catar por três meses.
Romário, Edmundo e Ramon no Fluminense em 2004
Divulgação
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A história começou a ganhar emoção em 13 de janeiro de 2004, quando o então presidente da Unimed, Celso Barros, chamou Romário para uma coletiva em Juiz de Fora (MG), onde o elenco fazia pré-temporada. O objetivo era anunciar dois grandes reforços: Edmundo, que defendera o Vasco no ano anterior, e Ramon, que estava no Verdy Tokyo, do Japão. A foto daquele dia se perpetuou.
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– Nós já tínhamos o Romário. O Edmundo e o Ramon foram oportunidades de mercado. O Fluminense até hoje faz isso. O Mário (Bittencourt, atual presidente) aprendeu um pouquinho e tem todos os méritos de fazer isso hoje. O Fluminense não tinha dinheiro naquela época, era a patrocinadora. Estávamos ali para dar visibilidade à marca e ajudar o clube a ter resultados técnicos – conta Celso Barros, que chegou a ser vice de futebol a convite do antigo presidente David Fischel.
Quatro anos antes, Edmundo havia deixado o Vasco após briga com Romário, eternizada pela frase “o rei, o príncipe e o bobo” dita pelo Baixinho. Agora, eles voltariam a atuar juntos.
No Flu de 2004, faltava uma peça para fechar o “quadrado mágico”. No fim de janeiro, o clube acertou a contratação de um velho conhecido: o meia Roger, então com 25 anos e no Benfica. Revelado pelo Flu, ele foi apresentado no Maracanã lotado antes de clássico contra o Flamengo.
Antes de 4×3 histórico do Fla, torcida do Flu cantou: “O Roger acabou com você”
“Era um time com muito talento. Você tinha o Léo Moura, que estava começando a ganhar projeção, tinha o Juan, que viria a ser o Juan do Flamengo dois anos depois, tinha o Diego Souza começando como volante, não o jogador que virou atacante ou meia. Tinha o Maicon chegando do Madureira, o Rodolfo que era um bom zagueiro”
Com quatro grandes nomes, jovens promissores e sob o comando do técnico Valdir Espinosa, o Fluminense começou a temporada cercado de otimismo, mídia e uma enorme expectativa por títulos. Mas os problemas logo começariam a acontecer…
O Romário e o Edmundo todo mundo sabia que eram brigados. Para nós era assustador. Éramos muito novos. E dentro de campo atrapalha um pouco, as decisões tomadas, o grupo, o dia a dia, o ambiente. Depois eles se entenderam. Gostaríamos de ter dado a sorte de eles não terem conflito. Imagine os dois jogando juntos, em alto nível, e com parceria. Seria maravilhoso.
O quarteto ali, infelizmente, não deu certo, tanto dentro de campo quanto fora. Existiam algumas vaidades que no futebol não se permite. E quando o grupo não está na mesma sintonia dificilmente algo de bom acontece. Existiam algumas distâncias entre esses jogadores. E aí, a gente que tinha amizade com todos, tentava fazer com que essas coisas não atrapalhassem o time.
Elenco do Fluminense ao longo de 2004
Goleiros: Fernando Henrique, Elinton Andrade e Danrlei
Defensores: Odvan, Laerte, Léo Moura, Junior Cesar, Zé Carlos, Filipe Machado, Jancarlos, Rodolfo, Antônio Carlos, Amarildo, Marcão e Juan
Meias: Roger, Marciel, Diego Souza, Arouca, Esquerdinha, Ramon, Juca, Maicon, Thiago Ramos
Atacantes: Rodrigo Tiuí, Mauro, Alessandro, Romário, Edmundo, Gil Bala, Alex Terra e Marcelo Macedo
A disputa pela 10
Com Romário perto dos 38 anos e recepcionando Edmundo de forma amistosa, o começo foi animador. Nos bastidores, porém, as coisas não demoraram a desandar. A primeira polêmica surgiu com a chegada de Roger. Muito querido pela torcida e com status de ídolo, o meia chegou para vestir a 10. Porém, o número já estava com Edmundo, que posteriormente aceitou vestir a 7.
O Edmundo tem razão quando diz que ganhei a camisa 10 na marra. Conquistei esse privilégio com o meu futebol, meu rendimento em campo
A disputa pelo número criou um mal-estar interno, e o clima piorou depois da final da Taça Guanabara, quando o Fluminense perdeu para o Flamengo por 3 a 2.
Futebol não é uma ciência exata. Obviamente, quando construímos alguma coisa, a expectativa é sempre a melhor
O desacerto no bicho e a primeira baixa
A final do turno marcou a estreia do quarteto, que pela primeira vez jogou junto. Ainda jovem na época, o ex-zagueiro Rodolfo lembra que houve uma discordância antes da partida.
– Na final da Taça Guanabara, houve uma discussão sobre premiação. Aí os cabeças grandes tiveram um desentendimento antes do jogo. É um fator que a gente não vê muito. Eu nunca tinha passado por isso. Mas o pessoal se entendeu, mas acabou que não teve muito o que brigar, nós perdemos o jogo.
Ao lado de Roger, Léo Moura comemora um gol pelo Fluminense em 2004
Agência O Globo
Com a derrota para o maior rival, a relação entre os jogadores piorou. Na estreia da Taça Rio, logo após o time empatar com o Botafogo por 0 a 0, o técnico Valdir Espinosa pediu demissão e deu entrevista afirmando que o ambiente estava insustentável. Era a primeira baixa.
– Notei que depois da derrota na final da Taça Guanabara, as pessoas já não me olhavam no olho e não quero trabalhar num ambiente assim – disse à época Valdir Espinosa, que morreu em 2020.
Vinte anos depois, o momento conturbado daquele período ainda é lembrado pelos jogadores.
– Era um time com muito glamour, muitos popstars. Tinha o Romário, o Roger que namorava muitas celebridades, o Edmundo, o Ramon, que batia muitas faltas… Isso do Edmundo e do Roger não se falarem… Tinha dia que o Romário chegava e não falava com ninguém, só treinava e ia embora. O Edmundo já falava bastante, dialogava com os mais jovens. O Romário sempre foi um cara bom, mas era mais reservado. O Edmundo era mais extrovertido. Os dois eram diferentes. O Roger era muito gente boa. O Ramon nem se fala, educação tremenda – diz Rodrigo Tiuí.
As duas finais que jogamos no Carioca eram para serem divisores de águas. O finado Epinosa tentou fazer de tudo. Para o treinador era um peso muito grande. Para os meninos foi marcante negativamente falando. Era a chance de ganhar um título com um time tão bom. Mas eu acho que o futebol tem dessas coisas. Para nós não foi legal.
O novo treinador
Em busca de um novo comandante para controlar os ânimos do elenco, o Fluminense anunciou Ricardo Gomes para o lugar de Valdir Espinosa. Na estreia, o time acabou goleado pelo Vasco por 4 a 0 na Taça Rio. O treinador decidiu então fazer mudanças: Romário, Edmundo, Ramon e Roger só jogariam juntos se estivessem em forma – o histórico de lesões era alto entre o quarteto nesse período.
– Muitas vezes eu chegava triste para treinar. O Ricardo é um cara de quem eu gosto, mas foi uma época difícil – disse Edmundo, ao jornal O Globo em 2004.
As decisões de Ricardo Gomes desagradaram aos medalhões. Edmundo chegou a dizer publicamente que não atuaria mais com o treinador, que pediu retratação pública. Os ânimos seguiram aflorados até o estopim com mais duas eliminações: o Flu perdeu a final da Taça Rio pelo Vasco e foi eliminado na Copa do Brasil pelo Grêmio nas oitavas de final.
Beto Cachaça comemora a Taça Rio conquistada pelo Vasco em 2004
Reprodução/Acervo O Globo
– O Romário tinha suas regalias, ele tinha em contrato que não treinaria. Ele só ia aos jogos, vez ou outra ia aos treinamentos. Teve uma época também que o Edmundo ficou de fora porque se machucou. Quando você vai acumulando histórias desse tipo, dificilmente vai formar um time vencedor. E naquela época não tinha o pensamento de formar um time para em dois ou três anos ser vencedor. As pessoas queriam resultados imediatos. Era difícil – recorda Roger, atualmente comentarista da Globo.
Alexandre Gama assumiu o Fluminense após a saída de Ricardo Gomes
Reprodução Instagram
“Sentar na janela” inicia desmanche
Com duas eliminações e um início ruim no Brasileiro, Ricardo Gomes foi demitido. Nomes como Abel Braga, PC Gusmão e Muricy Ramalho foram cogitados. Mas quem acabou assumindo como interino e depois permanecendo no comando da equipe foi Alexandre Gama.
Ele viria a ser protagonista na frase marcante de Romário “entrou no ônibus agora e quer sentar na janela”, ao começar a peitar e barrar os medalhões naquele período (veja no vídeo abaixo).
Em 2004, Romário ironiza Alexandre Gama: `Entrou no ônibus agora e quer sentar na janela`
Romário não gostou de declarações dadas por Alexandre Gama para a imprensa afirmando que Ronaldo “era maior”. Sem papas na língua, o Baixinho disparou a frase que se tornaria marcante naquele ano.
– Ele tem que prestar atenção no Fluminense. Entrou no ônibus agora e quer sentar na janela. Ele não fala o que quer? Quem fala o que quer ouve o que não quer – disse Romário em 2004.
Sem espaço com Alexandre Gama, Romário foi o primeiro a pular fora do ônibus: após uma derrota para o Goiás no Maracanã, o Baixinho rompeu o contrato com o Fluminense.
Quando se fala de Romário, Edmundo, Ramon, Roger, Marcão… São excelentes jogadores. A cobrança era grande. A torcida cobrou. Era uma chance muito boa de conquistarmos. Foi frustrante.
Sem Romário, o Fluminense deu fim a uma das polêmicas: a relação do Baixinho com Edmundo. Mas seguiu entre altos e baixos com dois desafetos: Edmundo e Roger.
– Teve um jogo em que ganhamos do Juventude de 7 a 1 em Volta Redonda. Eu fiz três gols. O Romário e o Edmundo, estavam machucados. Sobrou para mim. O Roger jogou também. E tinha uma parada de o Roger jogar muito quando os caras (outros do quarteto) não jogavam. Ele foi o cara do jogo, só não foi mais que eu porque fiz três gols e fui exaltado. E tem uma história que o Roger chega no vestiário e fala para o treinador que, se ele quisesse segurar o trabalho, ele teria que tirar os caras… E o Edmundo ficou doido quando isso chegou nele (risos) – recorda Rodrigo Tiuí.
Os gols de Fluminense 7 x 1 Juventude, pelo Campeonato Brasileiro 2004
O segundo a deixar o clube, ainda com a temporada em andamento, foi Roger. Após conseguir destaque, o meia foi barrado por Alexandre Gama. Sem aceitar o banco, rescindiu o contrato.
Se todos pensassem em prol do grupo, acho que tudo seria diferente. Quem não queria ter aqueles jogadores de talentos e currículo vencedor do seu lado? Infelizmente não aconteceu”
A rescisão de Roger, porém, seguiu dando o que falar. Logo após a saída do jogador, Edmundo concedeu uma entrevista polêmica, registrada nas páginas do jornal O Globo da época.
O ex-atacante assumiu publicamente que eles não se falavam e usou duras palavras ao se referir ao ex-companheiro. Revelou um episódio no qual Juca, volante que integrava o elenco, chamou Roger de “viadinho” em um treino. Após adotar o silêncio de imediato, Roger emitiu uma nota através da assessoria de imprensa ironizando Edmundo.
No início de qualquer grupo é sempre mil maravilhas. Com o tempo, ele vai se desgastando. Jogadores de personalidade, as relações vão ruindo”
Ano conturbado abriu portas
Com a saída de dois astros do quadrado que não teve nada de mágico em 2004, Edmundo e Ramon terminaram a temporada com o Fluminense, que no Brasileiro, após muito oscilar, finalizou a competição na 9ª colocação.
Os dois também deixariam o clube ao fim da temporada, assim como o presidente David Fischel, que foi sucedido por Roberto Horcades.
Montamos um time de astros, jogadores experientes, mas não deu certo. Foram muitos problemas de lesões e de relacionamento”
As campanhas do Fluminense em 2004
Carioca: perdeu a final da Taça Guanabara para o Flamengo e a Taça Rio para o Vasco.
Copa do Brasil: foi eliminado para o Grêmio nas oitavas de final.
Brasileirão: ficou em 9° lugar, com 46 pontos (18 vitórias, 13 empates e 15 derrotas).
Apesar dos fracassos acumulados em 2004, os entrevistados pelo ge concordaram em uma coisa. Para eles, aquele primeiro grande time montado com a ajuda da Unimed, apesar de não ter conquistado títulos, abriu portas e foi importante para um período vencedor do clube.
É o primeiro grande time. De onde estava, o Fluminense vindo da Série C, em 2001, 2002, foram times consistentes, mas o Fluminense passa a pensar grande em 2004 com a contratação de grandes jogadores. Volta a ter a atenção midiática. A partir daí começa a pensar maior e ter investimento maior. Sem dúvida, ali foi o pontapé para o Fluminense trazer grandes nomes e colher frutos, a Copa do Brasil e ser bicampeão brasileiro. 
Campanha do Fluminense em 2004
Logo no ano seguinte começou com o título estadual, e consequentemente, não repetiram os mesmos erros”
A parceria do Fluminense com a patrocinadora durou até o fim de 2014. No período, o clube venceu dois Campeonatos Brasileiros, uma Copa do Brasil, dois Campeonatos Carioca e também chegou a uma final de Libertadores pela primeira vez.
Em 2004, Vasco vence o Fluminense por 2 a 1 pela final da Taça Rio
Eu não acho que os resultados no futebol tenham sido ruins. O Fluminense terminou em nono no Brasileiro poucos anos depois de viver o seu fundo do poço em 1999. Era um clube em reconstrução. Não foi o que esperávamos. Mas já em 2005, quando a maioria tinha ido embora, fomos campeões cariocas e vices da Copa do Brasil. Então, acho que foi uma sequência do trabalho”
Todo passo do clube é importante para o futuro. São nas derrotas que conseguimos as maiores forças. Com certeza o Fluminense aprendeu com isso e estudou mais na hora de contratar. Depois vieram gerações vitoriosas. Sou muito honrado de ter feito parte da história do Fluminense”
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