Após saídas de Visa e Mastercard, chinesa Union Pay começa a reduzir as operações na Rússia
Duramente atingida pelas sanções ocidentais, que levaram empresas como as operadores de cartões de crédito Visa e Mastercard a deixarem o país, a Rússia corre o risco de perder também o principal serviço que vinha sendo usado como alternativa no setor de pagamentos: a Union Pay, da China. As informações são da revista Fortune.
Temendo ser igualmente atingida por sanções, apesar da proximidade entre Beijing e Moscou, a Union Pay resolveu que não ampliará suas operações na Rússia. Assim, de acordo com o jornal russo RBC, a companhia chinesa já parou de emitir novos cartões de crédito para bancos locais.
As saídas de Visa e Mastercard e o recuo da Union Pay não têm efeito doméstico para a Rússia, que utiliza dentro de seu território o sistema Mir, desenvolvido em 2014 e que funciona em um grupo restrito de países. Entretanto, os cidadãos locais ficam sem opções para efetuar pagamentos no exterior.
Cidadãos russos ficam sem opção para realizar pagamentos no exterior (Foto: Unplash/rupixen.com)
A emissão de cartões inseridos no sistema Mir tem aumentado exponencialmente na Rússia, chegando hoje a 116 milhões. Somente entre o final de 2021 e março de 2022, o NSPK (Sistema Nacional de Pagamento com Cartão, da sigla em russo) diz ter emitido 2 milhões de cartões para uso doméstico.
Para dar conta dessa demanda, o governo da Rússia tem recorrido a empresas da China em busca de chips de cartões bancários. E vinha se escorando no Union Pay para dar a seus cidadãos uma alternativa quando precisassem realizar pagamentos no exterior.
Inicialmente, essa situação parecia ser um ótimo negócio para a companhia chinesa. Entretanto, o cenário mudou devido ao temor da empresa de entrar na mira dos EUA e da União Europeia (UE). Caso viesse a desobedecer as sanções ocidentais, a Union Pay poderia, por exemplo, ser proibida de realizar negócios com norte-americanos e europeus, sendo assim excluída do sistema financeiro global.
China em alerta
Desde o início da guerra na Ucrânia, no dia 24 de fevereiro, a China deixa clara sua oposição às sanções impostas à Rússia. Beijing voltou a manifestar esse posicionamento em uma cúpula virtual que reuniu líderes da UE e do país asiático no dia 1º de abril.
Após a cúpula, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen disse esperar que, no mínimo, a China não interfira nas sanções ocidentais, mesmo que não as aprove. Ela admitiu, porém, que Beijing não deu nenhuma garantia de que não fornecerá suporte financeiro ou militar à China.
No dia anterior ao encontro virtual, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Zhao Lijian, havia afirmado que o país asiático “desaprova a solução de problemas por meio de sanções e se opõe ainda mais a sanções unilaterais e jurisdições de longo alcance que não têm base no direito internacional”.
Segundo Zhao, Beijing não admite ser forçada a “escolher um lado ou adotar uma abordagem simplista de amigo ou inimigo. Devemos, em particular, resistir ao pensamento da Guerra Fria e ao confronto do bloco”.
Entretanto, as empresas chinesas já começam a notar que talvez seja inviável manter os laços comerciais com Moscou sem pagar um alto preço. As três maiores empresas de petróleo da China foram aconselhadas a suspender os investimentos na Rússia. Igualmente, dois dos maiores bancos de crédito chineses deixaram de oferecer a seus clientes opções de investimento em commodities russas.
A Huawei é outra que cogita respeitar as sanções. A empresa, que já não é bem vista no Ocidente devido às acusações de servir ao governo chinês, teme se distanciar ainda mais desse importante mercado caso venha a desobedecer as determinações. Segundo o site da revista Forbes em russo, a empresa concedeu férias a funcionários e suspendeu temporariamente o recebimento de novos pedidos no país.
Por que isso importa?
Desde a invasão da Ucrânia pela Rússia, em 24 de fevereiro, mais de 600 empresas ocidentais deixaram de operar na Rússia, seja de maneira temporária ou definitiva, parcial ou integral. O levantamento foi feito pela Universidade de Yale, nos EUA.
A debandada custará caro ao consumidor russo, privado de produtos em setores diversos, como entretenimento, tecnologia, automobilístico, vestuário e geração de energia. Mas que também pode afetar o Ocidente, sobretudo nos casos do gás e do petróleo.
Pensando na Rússia, o maior impacto será causado pelo êxodo das empresas do setor de geração de energia, que já começaram a suspender sua atuação no país, cuja economia é fortemente dependente desse mercado. Destaque para a BP, empresa britânica de gás e petróleo que cancelou um investimento de US$ 14 bilhões na empresa estatal russa Rosneft, segundo a rede Voice of America (VOA).
Seguindo o mesmo caminho da tradicional rede de lanchonetes, a Coca-Cola também confirmou a saída da Rússia. “Nossos corações estão com as pessoas que estão resistindo a efeitos inconcebíveis desses trágicos eventos na Ucrânia”, disse a empresa em comunicado. A PepsiCo, por sua vez, deixa de vender bebidas na Rússia, mas mantém as linhas de produtos essenciais, como leite e comidas para bebês. O Starbucks fechou as lojas e interrompeu o fornecimento de produtos a parceiros.
Nessa área, as sanções já anunciadas por EUA e Reino Unido, que deixaram de comprar petróleo e gás da Rússia, tendem a causar problemas inclusive ao Ocidente, com a perspectiva de grande aumento global nos preços dos combustíveis. E pode piorar, vez que Moscou ameaça suspender o fornecimento de gás natural à Europa como represália e tem afirmado só aceitará vender esses produtos se o pagamento for feito em rublos russos, a fim de fortalecer sua moeda.
No setor de alimentação, alguns gigantes mundiais suspenderam suas operações na Rússia. Um deles é o McDonald’s, que fechou todos seus restaurantes. Ao final do ano passado, a rede tinha 847 lojas no país. Diferente do que ocorre no resto do mundo, onde habitualmente atua no sistema de franquias, 84% das lojas russas são operadas pela própria companhia. Somado ao faturamento na Ucrânia, a operação responde por 9% da receita global da empresa.
Loja do McDonald’s na Rússia (Foto: Wikimedia Commons)
A indústria automobilística também começou a deixar a Rússia, puxada pelas decisões das japonesas Toyota e Nissan de suspenderem a produção em suas fábricas em São Petesburgo. Ambas também anunciaram que deixam de exportar veículos ao país, decisão que foi acompanhada por outras gigantes do setor como Honda, Jaguar, Ferrari, GM e Volkswagen. Na área de aviação, a Boeing diz que não mais compraria titânio russo para usar na produção de aviões.
Outra decisão que tende a impactar na rotina dos russos é o fim dos serviços das companhias de cartões de crédito Mastercard e Visa. O maior banco estatal da Rússia, o Sberbank, disse que o impacto na rotina doméstica dos cidadãos seria pequeno. A instituição financeira assegurou que ainda é possível “sacar dinheiro, fazer transferências usando o número do cartão e pagar em lojas russas offline e online”, de acordo com a rede britânica BBC.
A tendência é a de que os consumidores russos possam usar os cartões normalmente até que percam a validade, e depois disso não recebam novos plásticos. Entretanto, os cartões emitidos na Rússia já deixaram de ser aceitos no exterior. Isso criou problemas, por exemplo, para turistas russos que ficaram impedidos de deixar a Tailândia, por problemas com voos cancelados e cartões bloqueados.
No setor de vestuário, quem anunciou estar deixando o mercado russo é a Levi’s, sob o argumento de que quaisquer considerações comerciais “são claramente secundárias em relação ao sofrimento humano experimentado por tantos”. Nike e Adidas também suspenderam todas as operações no mercado russo. A sueca Ikea, gigante do setor de móveis, é outra que decidiu deixar a Rússia em função da guerra.
Nas áreas de entretenimento e tecnologia, alguns gigantes também optaram por suspender as vendas de produtos e serviços no país de Vladimir Putin. A Netflix interrompeu seus serviços e cancelou todos os projetos e aquisições na Rússia, enquanto Warner, Disney e Sony adiaram os lançamentos de suas novas produções no país. Já a Apple excluiu os aplicativos das empresas estatais russas de mídia RT e Sputnik e disse que não mais venderá seus produtos, como iPhones, iPads e afins, em território russo. Panasonic, Microsoft, Nokia, Ericsson e Samsung são outras que optaram por encerrar as operações no país.
Duas importantes cervejarias da Europa, a holandesa Heineken e a dinamarquesa Carlsberg, também anunciaram que venderão seus negócios e deixarão de atuar na Rússia. Os planos da empresa da Holanda incluem manter o pagamento de seus funcionários até o final do ano, período no qual buscará um comprador, bem como vender o negócio sem margem de lucro. Já a companhia da Dinamarca diz que seguirá em funcionamento, mas com uma operação em pequena escala, até ser vendida.
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