Russos temem fronteiras fechadas e aumentam a busca por vistos europeus
Tem ganhado fôlego o movimento que pede maiores restrições à entrada de cidadãos russos em países europeus. Assim, com medo de serem definitivamente barrados, os russos aumentaram bastante a procura por vistos de países inseridos no Espaço Schengen, o que garante acesso à maioria dos Estados-Membros da União Europeia (UE). As informações são do jornal independente The Moscow Times.
O presidente ucraniano Volodymyr Zelensky chegou a sugerir que a UE, como bloco, interrompesse a emissão de vistos para todos os turistas russos. Ele argumentou que Moscou está “tirando as terras de outras pessoas”, então seus cidadãos deveriam “viver em seu próprio mundo até que mudem a filosofia”.
O governo da Finlândia já agiu nesse sentido, ao anunciar que reduzirá em 90% o número de vistos para russos, como forma de represália pela guerra na Ucrânia. Também será criada uma categoria especial, o visto humanitário, tendo como principais beneficiários jornalistas e colaboradores de ONGs. As medidas serão colocadas em prática a partir do dia 1º de setembro.
“Os vistos de turista não vão parar completamente, mas seu número será significativamente reduzido”, disse o ministro das Relações Exteriores finlandês Pekka Haavisto. “Isso significa que outros tipos de vistos, a parentes, contatos familiares, trabalho e estudo, terão preferência e mais tempo”.
Bandeira da União Europeia (Foto: Markus Spiske/Unsplash)
A Estônia, que apoia a decisão de vetar a entrada de turistas russos na UE, já registrou ao menos um episódio nesse sentido. Os alvos, porém, não foram cidadãos russos. Na quarta-feira (17), o Moscow Times relatou que uma família ucraniana foi impedida de entrar em território estoniano sob o argumento de que seus membros “passaram tempo demais na Rússia”.
Outros países que fazem fronteira com o território russo, como Letônia, Lituânia e Polônia, endureceram as regras de emissão de vistos. No entanto, admitem que é necessária uma posição conjunta da UE para regular a questão, vez que o visto eventualmente emitido por um país inserido no Espaço Schengen não pode ser recusado por outro.
Cidadãos precavidos
Tais notícias levaram muitas pessoas a se prevenir. “Não acredito que a UE deixará de emitir todos os vistos para os russos. No entanto, me sentirei mais confortável com um visto Schengen, mesmo que não vá a lugar nenhum agora”, disse um residente de Moscou que solicitou o visto e pediu para não ter o nome revelado.
Segundo Maya Lomidze, chefe da Associação Russa de Operadores de Turismo, o número de pedidos por vistos para países do Espaço Schengen dobrou nas últimas duas semanas. E muitas vezes eles custam caro. O indivíduo residente em Moscou que pediu para não ser identificado diz que pagou 25 mil rublos (R$ 2,1 mil) a uma agência que intermediou o processo. Ele espera o documento para o final do mês.
Tatiana, uma russa que vive no exterior e omitiu o sobrenome, também se antecipou a um eventual bloqueio. “Esta situação parece muito assustadora”, disse ela. “Moro na Europa, e meus parentes moram na Rússia. E se as fronteiras estiverem fechadas e minha mãe não puder me visitar?”, questionou.
Aqueles que correm atrás do visto enfrentam um problema adicional: o tempo de espera por uma vaga para fazer a solicitação. Além do aumento da demanda, muitas embaixadas estão com a equipe reduzida, fruto da expulsão de diplomatas por parte de Moscou. Tal movimento, que gerou um movimento de reciprocidade em toda a Europa, está atrelado tanto à guerra quanto a denúncias de espionagem.
Isso sem falar, claro, no aumento da desconfiança por parte dos governos europeus. “Documentos, passagens aéreas e confirmações de reservas estão sujeitos a um escrutínio mais minucioso. Em alguns casos, um pedido de visto pode ser negado”, disse Alina Protsenko, chefe do departamento de suporte a vistos da agência de turismo russa Aero Club Tour.
E aqueles que obtiverem o visto de forma preventiva ainda podem ter uma surpresa desagradável. As nações europeias habitualmente emitem vistos com prazos longos de duração, de alguns anos. Porém, em meio à guerra, muitos vistos passaram a ter uma validade de alguns poucos dias, com foco somente em uma viagem específica.
Demissões em larga escala
O movimento oposto, de estrangeiros que tentam entrar na Rússia, sofreu uma severa redução desde o início da guerra. Uma das causas é o fechamento do espaço aéreo para aeronaves russas ou provenientes da Rússia, parte das sanções impostas pelo ocidente a Moscou como punição pela agressão à Ucrânia. Além dos aeroportos que tiveram que ser fechados devido à proximidade com os combates.
Em virtude dessa mudança de cenário, quase a metade da equipe de controle de tráfego aéreo da Rússia está em licença temporária ou perdeu o emprego. Foram registradas duas mil demissões na Corporação Estatal de Gerenciamento de Tráfego Aéreo, sendo 600 casos somente de controladores de tráfego. Outros 20% estão ociosos ou atuando somente por meio período.
Bloqueio total
O bloqueio total para cidadãos russos, sugerido por Zelensly, deve ser debatido pela UE no final de agosto. Isso ocorrerá em reunião dos ministros da Relações Exteriores dos membros na República Tcheca, que detém a presidência rotativa do bloco e é favorável à medida. “Nas futuras reuniões do conselho europeu, essa questão será ainda mais forte. Minha posição pessoal é a de que o turismo deve ser restringido”, afirmou a premiê finlandesa Sanna Marin.
A ideia, porém, não é unânime. A tendência é que seja contestada por países que mantêm laços fortes com Moscou, como a Hungria. Mesmo nações que se opõem fortemente à Rússia, caso da Alemanha, podem vetar a medida, argumentando que separaria famílias, considerando a grande comunidade russa no exterior. A Comissão Europeia cita, ainda, casos de jornalistas e dissidentes, dizendo que todos os vistos a essas categorias de pessoas devem ser concedidos.
O Kremlin, por sua vez, condenou a ideia. “Qualquer tentativa de isolar a Rússia ou os russos é um processo que não tem perspectivas”, disse o porta-voz Dmitry Peskov na semana passada, acrescentando que a proposta exibe uma “irracionalidade de pensamento” que está “fora dos gráficos”.
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