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É mais fácil imaginar o fim do mundo do que o fim do capitalismo

É mais fácil imaginar o fim do mundo do que o fim do capitalismo

Conseguimos pensar um futebol melhor, mas não percebemos que queimadas, desmatamento e poluição nos levarão ao fim do futebol, das atividades físicas, do mundo, da vida. Esta famosa frase do filósofo britânico Mark Fisher, no livro Realismo Capitalista, tenta nos fazer refletir sobre alternativas ao capitalismo e a quase impossibilidade de imaginá-las. Pior, sabemos que caminhamos rapidamente para o fim do mundo, tal e qual o conhecemos, por causa da catástrofe climática por demais instalada entre nós, mas nada fazemos para detê-lo, não conseguimos agir. Ora, a catástrofe climática que vivemos tem como fator principal a ideologia do progresso, da dominação da natureza, da extração desenfreada de lucro na “natureza barata”, a natureza vista como à disposição do homem e mercadoria. Este conceito é do geógrafo estadunidense Jason Moore, que também cunhou a Era que vivemos de Capitaloceno, onde a catástrofe climática é claramente determinada pelo capitalismo.
Mineirão com fumaça por conta das queimadas em BH e região
GUilherme Macedo/TV Globo
Se não conseguirmos realizar uma alternativa ao capitalismo, o fim do mundo tratará de fazê-lo. Ao preço do fim da vida, não apenas dos seres humanos, mas provavelmente de quase todas as formas de vida. E por que não conseguimos imaginar o fim do capitalismo? Porque só conhecemos uma forma de vida (nós ocidentais colonizadores), acreditamos ser a melhor: a do crescimento, a do progresso, a do desenvolvimento. Esta forma de vida é conhecida por capitalismo. Nem sempre foi assim nos duzentos mil anos da história humana, aliás aconteceu apenas nos últimos 500 anos, quando iniciou-se esta ideologia do crescimento e do desenvolvimento.
Estas linhas me surgem olhando pela janela, no Rio de Janeiro, e não conseguindo ver o horizonte, nem mesmo as montanhas que cortam a cidade ao meio, muito menos o sol. E não é um dia de chuva. Eu já vira dias assim no interior de São Paulo, em Brasília, em Mato Grosso do Sul, no Paraná e por todo o Norte do país, mas jamais no Rio de Janeiro, por um motivo simples: a fumaça que impede a visão de enxergar 100 metros à frente, é comum na floresta amazônica, no cerrado e em áreas agriculturáveis, não no Rio de Janeiro, Estado onde a agricultura ocorre apenas ao norte, não na região centro-sul, onde está a capital. Mas agora, a fumaça das queimadas na Amazônia impede os cariocas de ver o sol. É o progresso, o desenvolvimento, a aceleração do crescimento que nos impedem de ver o sol, mas nos faz ver o fim do mundo. Não conseguimos ver o fim do capitalismo, mas, sim, o fim do mundo.
Beira-Rio alagado pela enchente
Divulgação/Comunicação Internacional
Estamos assistindo ao fim do mundo em nossas janelas, em todas elas, não há escapatória. Mas nada fazemos. Por um motivo simples: acreditamos religiosamente no progresso, no desenvolvimento, no crescimento. Religiosamente. Há teorias econômicas seríssimas que pregam o decrescimento, a desaceleração, mas nós seguimos firmes acreditando que apenas o progresso e o desenvolvimento nos salvarão. Ao contrário… Esta ideologia está impregnada em cada milímetro, em cada milésimo das nossas vidas. Inclusive no esporte.
Grêmio, Inter e Juventude devem até hoje jogos na tabela por causa da catástrofe climática ocorrida no início do ano (já falamos aqui, em outra coluna, que este fato será comum num futuro próximo em muitas cidades brasileiras). Mas não mudamos nossos estilos de vida. Chamam de culpa do calendário a epidemia de contusões no futebol brasileiro. Pode ser. Mas ninguém fala que jogavam-se 100 partidas por ano, em gramados muito piores e muito maiores há 30 anos, e não havia tantas contusões. Lembrarão da intensidade das partidas. Mas não houve o ‘progresso’ científico na preparação física, os gramados não estão melhores, os campos menores e a qualidade do material esportivo não ‘desenvolveu-se’?
Por que ninguém fala da baixa umidade que assola o centro-sul do país neste momento, com alertas vermelhos todos os dias recomendando que não se faça exercícios físicos ao ar livre e causando doenças respiratórias na população? Por que não se fala que, no Brasil, mais de 50 mil mortes prematuras ocorrem anualmente por causa da qualidade do ar? Qualidade do ar está ligada diretamente à qualidade de vida. Por causa do desmatamento e das queimadas, o Brasil é o quarto país que mais emite gases poluentes no mundo. E isso não muda em nada a qualidade do futebol por aqui? Se muda a qualidade da vida de todos nós, por que a atividade física não seria afetada?
Faltam pesquisas no Brasil, mas especialmente falta juntar “lé com cré”. É tão óbvio que tudo isso ocorra no esporte brasileiro, que só uma coisa me vem à cabeça: é mais fácil imaginar o fim do mundo do que o fim do capitalismo. A gente olha – ou deixa de olhar – o horizonte e não consegue entender que não ver o sol por causa das queimadas na Amazônia significa o fim do mundo e com o fim do mundo vem o fim do futebol… Quando o mundo acabar, seu time não jogará mais!!! Se seu filho ou seu avô tem dificuldade para respirar por causa da baixa umidade, se tem muita gente tendo problemas respiratórios, isso não afetaria toda a população? Por que o excesso de jogos (mesmo com tecnologia empregada na educação física, mesmo com menos jogos que no passado, mesmo com gramados melhores e menores, mesmo com material esportivo mais desenvolvido) causa contusões – e causa, mas a poluição do ar e a baixa umidade não?
E tudo isso pode ser mais direto: no Acre, por exemplo, o ge.globo noticiou, campeonatos foram paralisados por causa das queimadas. Os Jogos Estudantis foram paralisados por causa das queimadas. Este ano foi no Acre. Assim como as chuvas no Rio Grande do Sul impediram os times locais de jogarem seus campeonatos. Este ano foi no Rio Grande do Sul. Tenho uma má notícia: isso vai se repetir e vai se espalhar por todo o país. Isso não é catastrofismo, mas estudos científicos nos mostrando. Todos nós nos baseamos em estudos científicos para tudo. Menos quando o assunto é imaginar o fim do mundo. Pois confundimos ciência com tecnologia, progresso, desenvolvimento, crescimento.
Aqueles que pensam ser nosso calendário um escândalo, aguardem o atropelo causado pelas catástrofes climáticas. Aqueles que criticam nossos gramados, esperem só. Todos têm razão. Mas apenas na medida em que denunciem que vai piorar, e muito.
Conseguimos pensar em gramados melhores, calendários menores, mas não em diminuir as queimadas, o desmatamento, a poluição do ar. Ou seja, conseguimos pensar um futebol melhor, mas não percebemos que queimadas, desmatamento e poluição nos levarão ao fim do futebol, das atividades físicas, do mundo, da vida.
EMANUEL CASTRO (@Uoeepossivel)
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Em todas as colunas deste blog atualizarei as estatísticas mais importantes para o esporte e para a vida: a de emissão de dióxido de carbono na atmosfera. Cientistas da ONU afirmam que quando o índice passa dos 400 ppm, isso significa que a poluição química afeta irremediavelmente cada ser vivo de nossa biosfera. E as possibilidades de a vida perseverar no planeta diminuem a cada aumento do índice. Nosso objetivo é alertar para a catástrofe climática em curso, já está entre nós. Um campeonato perde-perde onde somos premiados com a extinção. Esta é a mãe de todas as estatísticas.
Por 6 mil anos, até a Revolução Industrial (circa 1840): 280 ppm
1960: 316 ppm
2000: 369 ppm
2015: 401 ppm
AGOSTO 2023: 419 ppm
AGOSTO 2024: 422 ppm
Milhares de cientistas reunidos pela ONU afirmam há anos que quando a temperatura da Terra subir 1,5 grau Celsius acima da temperatura do século XIX (Revolução Industrial), os efeitos da Emergência Climática serão imediatos e cada vez mais catastróficos, muitos deles irreversíveis. A revista científica mais conceituada do planeta, a britânica Nature, afirmou, em fevereiro de 2024, que acabamos de atingir 1,7 grau acima da marca. E continuamos a acelerar rumo ao desastre. geRead More

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