Lyanco abre o jogo sobre saúde mental e momentos de pânico: “Achava que ia morrer”

Zagueiro do Atlético-MG revela momentos difíceis no Catar, relata tratamento e como espera ajudar mais pessoas: “Às vezes sentava na cama e pensava: amanhã vou morrer. Não vou ver meus filhos'” Gol de dentro da área de Lyanco do Atlético-MG contra o América-MG
Tontura, falta de ar e tremedeira. Sintomas de uma transtorno silencioso e que trouxeram desespero ao zagueiro Lyanco durante parte da sua passagem pelo futebol do Qatar, em 2024. As crises de madrugadas, a sensação que cairia duro durante um simples passeio no shopping ou em um jantar com a família, ligaram um alerta para a saúde mental, para o transtorno do pânico.
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Lyanco fala abertamente do problema que o assombrou e mudou toda sua rotina no ano passado. Ainda em tratamento, o defensor detalhou como descobriu o transtorno, como lidou com as crises de pânico até ser diagnosticado da forma correta. Hoje, ele é um dos destaques do Atlético-MG nesta temporada.
— Era madrugada, às vezes, à noite, eu sentava na cama: “Vou morrer, amanhã não vou ver meus filhos”. Foram momentos difíceis.
— Você se sente mal. Sabe quando você está em algum lugar e fala: “Nossa, você tá começando a ficar ruim, você está estranho”. Aquilo ali vai te consumindo de uma forma: “Meu Deus, preciso ir para o hospital, vou cair duro e morrer — relatou o zagueiro ao ge.
Lyanco faz relato forte sobre a saúde mental em entrevista ao ge
André Ribas/ge
A descoberta aconteceu durante o ano passado. Lyanco pertencia ao Southampton, da Inglaterra, e acabou emprestado ao Al-Gharafa, do Qatar.
Em simples ações do dia a dia, o defensor tinha crises ainda sem entender qual era o problema. Foi quando os primeiros sintomas apareceram e as idas ao hospital viraram rotineiras.
— Os meus sintomas eram tontura, falta de ar, que você começa a respirar mais ofegante, dá aquela sensação, às vezes, você nem estava com falta de ar, mas (imitando puxando ar) puxava. Tremia muito, mão, corpo, eu dormia tremendo, peito. Dormia assim. Até você entender que era o mental, meu Deus, para mim, essa tremedeira era um problema sério de saúde, questões físicas.
Ele passou por uma bateria de exames para tentar identificar qual era o problema. Com todos os especialistas possíveis. E nada apareceu.
— Quando cheguei: “Caraca, realmente é isso, então”, foi quando fui ao hospital não sei quantas vezes, fazer todo tipo de exame, porque eu achava que tinha alguma coisa. Fui ao cardiologista, pneumologista, neurologista. Fiz exame de sangue, de tudo. Eu achava que estava com tudo. Quando vi os exames: “Realmente, é a questão do pânico, da ansiedade”.
— Um período longo até chegar a essa conclusão. E até depois: “Caraca, os exames estão todo certos. Médico não achou isso, eu estou com alguma coisa, é impossível. O médico que fui não sabe de nada”. Foi aí que entendi que estava passando por isso. Vi que minha saúde (física) estava bem e era um problema mental.
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Lyanco precisou lidar com a desconfiança, até de familiares, sobre o problema. Algo comum quando se trata de doenças mentais.
— Quando comecei a sentir essas coisas, até familiares que estavam próximos: “Para, é coisa da sua cabeça. Você não está com isso”. Até depois verem, realmente, o que está acontecendo. Para quem está fora, é muito difícil. Hoje eu conseguiria ouvir e escutar alguém, mas porque eu passei. Vai além de classe social, cor, dinheiro, se a pessoa é forte ou não é.
— Precisei de família, psicólogo, psiquiatra. Quando você tenta sozinho, é pior, sua mente vai muito mais longe do que você quer. Precisei muito de apoio, de pessoas que realmente entenderam o que eu estava passando.
Lyanco ao lado dos filhos e da esposa.
André Ribas/ge
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O que é a doença
O médico psiquiatra Lucas Soares explica o que é a síndrome do pânico, os principais sintomas e todo o processo até o diagnóstico.
— Uma crise de pânico é um episódio muito angustiante, que pode ocorrer subitamente e atingir um pico em poucos minutos. Os sintomas mais comuns é taquicardia, suor excessivo, falta de ar, tremores, tontura, desconforto gastrointestinal e formigamento dos membros. Durante uma crise de pânico, o indivíduo pode chegar a ter a percepção de que está prestes a morrer ou de que está perdendo o controle sobre si.
— De modo geral, esses sintomas duram poucos minutos, porém, podem impactar negativamente toda a rotina do paciente, gerando, inclusive, medo de frequentar locais nos quais não se sinta seguro, como, por exemplo, ambientes fechados ou com muitas pessoas.
Ansiedade eu atleta
Istock Getty Images
Servir de exemplo para ajudar
Lyanco segue em tratamento. A síndrome de pânico necessita de acompanhamento médico e ajuda de medicamentos receitados para ser controlada.
Hoje, o zagueiro se sente confortável para falar sobre o tema, mas nem sempre foi assim, como contou sua esposa.
— Quando vi a primeira entrevista, ele falando sobre, pensei: “Foi bom. Ele agora está pronto para falar”. A gente vê que as coisas não são no nosso tempo. Cada vez que ele fala sobre, eu fico realizada — disse a esposa do jogador, Yasmin.
Esposa de Lyanco, Yasmin acompanhou todo processo de recuperação do marido.
André Ribas/ge
Agora, ele quer que seu caso sirva de exemplo para pessoas que passam pela mesma situação e ainda não entendem o que é.
— Continuo com minhas coisas (acompanhamento médico), até quem não está passando deveria fazer. Consultar um psicólogo, conversar, colocar o que está sentindo. Chega uma hora, como aconteceu comigo, foi de pouquinho e pouquinho, até que uma hora estourou tudo. Por mais que a gente se sente bem, chega uma hora que acontece.
— Continuo com meus trabalhos fora campo, mas é totalmente diferente. Em campo, o ambiente te ajuda a trabalhar esse lado mental. Quando as coisas estão boas, você vai relaxando, vendo que está calmo. Hoje está totalmente diferente, só continuo com meus trabalhos mentais. Isso é uma coisa que quero continuar.
Lyanco comemora gol em Atlético-MG x América-MG
Pedro Souza/Atlético
O futebol trouxe a estabilidade financeira para Lyanco desde cedo. Ainda jovem, foi transferido para Europa, construiu uma família, teve dois filhos e sempre o apoio da família.
Nada disso impediu os momentos de angústia que viveu pela doença. Tem o carro que quer, tem a casa que ele quer, família. O que mais falta?
— Uma pessoa veio falar comigo desse jeito e respondi exatamente assim. Trocaria tudo que você falou para ficar sem sentir o que eu sentia. Eu, de verdade, trocaria tudo para deitar na cama e pensar naquele momento: que bom respirar bem.
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