O calvário da Matonense: primeiro time de Grafite completa dois anos sem vencer

“É difícil, é complicado, é um clube que a gente tem um carinho”, diz ex-atacante. Sensação dos anos 1990, time caiu para última divisão de SP Recorde grandes momentos da Matonense nos anos 90
Primeiro clube profissional de Grafite, ex-atacante e atual comentarista do Grupo Globo, a Matonense completa, nesta quarta-feira, dois anos sem vencer. A última vitória do time de Matão (SP), fundado em 1976, foi em 2 de abril de 2023. A vítima foi o EC São Bernardo, que levou 1 a 0 na terceira rodada do quadrangular final na Série A3 do Paulista.
De lá para cá, já são 33 partidas seguidas sem vitória, com 30 derrotas. Como consequência da má fase, o clube acumula dois rebaixamentos em sequência. Caiu da A3 para a A4 em 2024 e da A4 para a Segunda Divisão Sub-23, equivalente ao quinto nível estadual, em 2025. Encerrou o campeonato deste ano com 14 derrotas em 15 partidas.
— Me recordo que logo depois da pandemia eu fui procurar notícias da Matonense e vi que a equipe estava procurando se reestruturar, estava eminente a chegada de patrocinadores, até de uma SAF se falava, mas acabou não acontecendo. E hoje a Matonense está passando por tudo isso. É difícil, é complicado, é um clube que a gente tem um carinho, que conhece um pouco da história, da cidade e dos torcedores. Mas é um muito difícil hoje fazer futebol no Brasil, com exceção dos clubes de Série A e B. Está difícil por conta de falta de investimento, investimentos concentrados em clubes de Brasileiro. E clubes do interior, como a Matonense, que eram destaque no final dos anos 1990, início de 2000, estão esquecidos — afirmou Grafite em entrevista ao ge.
— A gente fica triste e espero que um dia a Sociedade Esportiva Matonense possa voltar a figurar entre as forças do futebol de São Paulo e, quem sabe, disputar a primeira divisão.
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Grafite em atuação pela Matonense, em 2001
Acervo EP
Chegada à Matonense
Grafite tinha 21 anos quando chegou a Matão (SP) no final de 2000. Antes, tinha jogado a Série B1-B, quinta divisão estadual à época, pelo Campo Limpo.
— A Matonense é muito importante pelo fato de ser o primeiro clube profissional. Por mais que o Campo Limpo seja profissional, na quinta divisão do Paulista, foi na Matonense que comecei a seguir regra de concentração, horário, pré-temporada – contou.
Quando ainda estava o Campo Limpo, foi destaque em um amistoso contra a Ponte Preta de Estevam Soares em setembro. Por conta disso, o empresário de Grafite conseguiu um teste na Matonense em dezembro, quando Estevam já estava por lá.
O atacante havia acabado de se profissionalizar e ainda era conhecido como Dina, diminutivo de Edinaldo Batista Libânio, nome de batismo. Foi na Matonense que ganhou, por meio do técnico, o apelido que carrega até hoje. Estevam alegou semelhanças físicas entre o atacante e Grafite, um jogador com quem atuara quando ainda era atleta.
— Para mim era tudo novo. No Campo Limpo não faltava nada, a gente tinha uma estrutura em termos de habitação, concentração, morava em uma casa que tinha em Campo Limpo. Tínhamos três refeições por dia. Cheguei na Matonense, um clube que já havia jogado a primeira divisão, tinha uma estrutura melhor, tinha concentração. Fiquei morando lá no período de testes, tinha alimentação três vezes ao dia. A cidade era muito boa. Era uma cidade grande, mas o meio que a gente vivia no Centro era pequeno e tinha toda estrutura. Fiquei pouco tempo, quatro cinco meses.
Grafite em atuação pela Matonense em 2001
Acervo EP
Aprovado, compôs o elenco do Paulistão de 2001. No entanto, demorou para ser utilizado em campo. No total, foram oito partidas em um gol, contra a Ponte Preta.
— No começo eu não jogava muito, apesar de o Estavam Soares ter me aprovado nos testes, ele me utilizou muito pouco no tempo em que eu estava lá. Depois, com a saída dele e a chegada do Mauro Fernandes eu comecei a atuar mais. Cheguei até a ser titular em alguns jogos com ele, mas infelizmente a equipe não fez um bom campeonato naquele ano e não se classificou […]. Foi a primeira vez que trabalhei com jogadores experientes, que tinham jogado Série A: Gilson Batata, Guará, Ranielli, Piá. Foi muito bom para mim no aspecto esportivo e pessoal também, de aprendizagem e crescimento como pessoa.
Ao término do Paulistão, Grafite foi emprestado para a Ferroviária. Do clube da vizinha Araraquara (SP) foi para o Santa Cruz e depois para o Grêmio, tudo por intermédio de Antônio Aparecido Galli, histórico dirigente da Matonense.
— Ele fez a negociação que possibilitou jogar a Série A do Brasileiro. Ele teve o retorno financeiro esperado depois da minha venda para o Grêmio. Eu o encontrei recentemente no sorteio da Copinha, conversei bastante com ele, é um cara que tenho um respeito especial por ele e ele por mim. Por isso a Matonense é muito importante na minha carreira e crescimento profissional.
Grafite quando defendeu a Ferroviária em 2001
Acervo EP
Crise sem fim
A carreira de Grafite decolou. Passou pela Coreia do Sul, Goiás e São Paulo, onde foi campeão Paulista, da Libertadores e Mundial em 2005. Passou pelo futebol francês, ganhou a Bundesliga, da Alemanha, pelo Wolfsburg e também jogou pelo Al Ahli, do Emirados Árabes Unidos.
Ainda fora do país defendeu o Al-Sadd, do Catar, e voltou ao Brasil para jogar duas temporadas pelo Santa Cruz, em 2015 e 2016, Athletico-PR em 2017, e retornar ao Tricolor de Pernambuco para se aposentar no mesmo ano.
Grafite quando atuava pelo Santa Cruz
Marlon Costa/Pernambuco Press
A Matonense, por outro lado, nunca mais repetiu os tempos de glória que teve no fim dos anos 1990, quando saiu da B1 e chegou à elite em três anos. O elenco que conquistou acesso ao Paulistão chegou a ter Dorival Júnior e Zé Carlos, lateral que defendeu o Brasil na Copa da França. O clube caiu em 2002 e nunca mais voltou para a primeira divisão.
— Acompanhei que no ano seguinte jogou a Série A e depois começou um período complicado para o clube, em que caiu de divisão. Acho que o Galli se afastou uma época da Matonense. Depois, comecei a acompanhar pouco porque naquela época não tinha toda tecnologia de hoje para acompanhar as divisões inferiores do Campeonato Paulista. A cidade sempre se destacou pela cultura agrícola que tem. Sei que estava tentando volta à elite, não se é com a mesma diretoria, mas a Matonense tem um lugar sempre especial. Tem uma camisa aqui em casa no mural dos clubes que joguei, azul e branca. Sempre lembro da Matonense. Todo mundo fala que que sempre comecei na Matonense, não lembram do Campo Limpo, aí eu falo que comecei no interior de São Paulo – destacou Grafite.
Zé Carlos em atuação pela Matonense em 1997; Dorival Júnior (o último agachado, da esquerda para direita) era volante desse time
Gazeta Press
Sem recursos para a disputa do estadual, a Matonense tem buscado nos últimos anos parcerias para manter o futebol ativo. Em 2025, passou a ter os departamentos profissional e amador (sub-20) sob administração da Maranata Sport, empresa de Pato Branco (PR), que encerrou as atividades durante a Série A4.
Em 2024, a Matonense foi rebaixada na Série A3 sem sequer ter terminado a competição. Com quatro rodadas para o término, a agremiação foi suspensa pelo TJD-SP (Tribunal de Justiça Desportiva) por suspeitas com manipulação de resultados. Na reta final, a equipe perdeu por W.O. os jogos restantes.
Posteriormente, o clube foi absolvido, mas cinco jogadores foram suspensos entre 180 e 360 dias após julgamento de partidas suspeitas na A3 do ano passado. O TJD-SP condenou os atletas por “atuarem deliberadamente de modo prejudicial à equipe que defendiam”.
Matonense, clube da Série A4 do Paulista
Jonatan Dutra
Na última rodada da primeira fase da A4 deste ano, um novo W.O. Desta vez por falta de policiamento no Estádio Sócrates Stamato, em Bebedouro (SP), onde a partida contra o Penapolense seria realizada.
Com o Estádio Hudson Buck interditado desde o início da temporada por más condições do gramado, a Matonense não jogou nenhuma partida em Matão neste ano. A alternativa foi mandar os duelos em Taquaritinga (SP) e Catanduva (SP).
Estádio Hudson Buck Ferreira, em Matão
Divulgação/Prefeitura de Matão
Antes da rodada final, o clube enfim havia conseguido a liberação de sua casa, mas na semana do jogo a Federação Paulista de Futebol (FPF) voltou a vetar o Hudson Buck.
Com isso, a diretoria conseguiu mandar a partida em Bebedouro, mas não havia tempo suficiente para a Polícia Militar organizar efetivo para a partida – o prazo pedido era de 20 dias –, já que a solicitação ocorreu na quinta-feira e o jogo estava marcado para um sábado. geRead More